Ao assumir a Cátedra de Física Biológica na Universidade do Brasil, em novembro de 1937, algumas questões importantes se impunham para Carlos Chagas Filho, relativas à sua visão estratégica sobre a institucionalização da pesquisa em ciências básicas na universidade, e que nortearia sua intenção de implantar um novo e amplo programa de pesquisas. A primeira delas referia-se à opção por permanecer na Universidade do Brasil ou no Instituto Oswaldo Cruz da Fiocruz (IOC). Até então, Chagas Filho havia acumulado a atividade docente na Faculdade de Medicina com a pesquisa nos laboratórios de Manguinhos e a docência no Curso de Aplicação

Ao tomar posse da cátedra Carlos Chagas Filho foi obrigado a se desligar do IOC, por força da lei recém-promulgada que impedia a acumulação de cargos no serviço público. Por outro lado, a mesma lei foi responsável pela exoneração dos demais assistentes da cátedra, o que lhe permitiria espaço para a formação de uma nova equipe. Os primeiros nomes a fazer parte da equipe do Laboratório de Física Biológica foram Tito Enéas Leme Lopes, que estava no interior de São Paulo, e Lafayette Rodrigues Pereira Filho, que já fazia parte da equipe da cátedra quando o titular era seu pai. Ambos eram contemporâneos de Chagas Filho na Faculdade de Medicina. 

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O próximo passo seria encontrar um modelo científico, um tema e um objeto sobre o qual construir sua agenda de pesquisa, aplicando as modernas técnicas da Biofísica. Paralelamente, ocupava-lhe o espírito o fato de que a nova disciplina exigia formas distintas de institucionalização. O peixe elétrico Poraquê Amazônico (Electrophorus electricus) fornecia-lhe um dado essencial: era a ligação de que necessitava com a Ciência nacional e com um modelo de política científica voltado para modernização do país, através da ênfase na formação não só de cientistas, mas também de professores que atuaram no ensino secundário, reformulando, a partir do alto, todo o sistema educacional. Havia também uma forte preocupação com o baixo nível de profissionalização da ciência no Brasil.

Carlos Chagas Filho optou por estabelecer-se e implantar seu projeto na universidade contando principalmente com o fato inegável de que este era um terreno no qual poderia acionar seus recursos sociais e seu capital científico de forma bem mais eficaz. Alguns dos atores envolvidos na reformulação da estrutura universitária, e que ocupavam postos-chave na alta burocracia estatal naquele momento, eram pessoas bastante próximas ao nosso personagem. Criadas as condições, restava ainda a dificuldade de identificar os perfis e os nomes que fariam parte da equipe. Se as faculdades e escolas de ciências ainda estavam em fase de implantação, a estratégia adotada seria buscar profissionais entre os que, como ele, fizeram da formação científica uma opção pessoal, construindo seu próprio caminho.

De Manguinhos veio Almir Castro, a quem responsabilizou por elaborar o curso de estatística de pequenas amostras aplicada à genética. Veio também Hertha Meyer, cientista alemã de origem judaica, que trabalhava no laboratório de preparação de vacinas. Graças à repercussão de seus trabalhos sobre cultura de tecidos cardíacos, foi possível montar em 1940, com auxílio de Evandro Chagas e o financiamento de Guilherme Guinle, o Laboratório de Cultura em Tecidos.

Uma importante estratégia de recrutamento foi feita entre os alunos do curso de medicina, principalmente entre os do 1º e do 2º ano. Eles faziam sua iniciação científica estudando algum aspecto dos potenciais elétricos do peixe Poraquê (Electrophorus electricus), sendo essa prática de socialização adotada até meados da década de 50. Segundo Darcy Fontoura de Almeida, ela permitia que se ampliasse o campo para a investigação biofísica, era também a forma de treinamento nas técnicas experimentais, além de representar a valorização em si de um tema da ecologia nacional.

A grande modificação institucional viria ao final do ano de 1945, com a elevação do status do Laboratório de Biofísica, que de fato ainda era a Cátedra de Física Biológica, em Instituto de Biofísica, e mantinha, como não poderia deixar de ser, relações bastante próximas com a redemocratização do país, após o fim do Estado Novo. Por estar num momento de transição entre dois modelos de pesquisa, o básico e o aplicado, e por não haver ainda uma política voltada para o desenvolvimento científico, Chagas Filho também enfrentava dificuldades de toda ordem para implantar seu projeto científico na universidade. Foi necessário estabelecer compensações salariais para viabilizar a permanência dos pesquisadores, e elas provinham principalmente da verba Guinle e de bolsas da Fundação Rockfeller.

Texto baseado no artigo: Um estudo de caso: a criação do Instituto de Biofísica, de Ana Luce G. S. Lima